Lei que institui o ‘Dia do fundador de Iperó’ gera polêmica e é alvo de contestações de historiadores e familiares de moradores à época
MAIS UM FERIADO (PONTO FACULTATIVO)! A lei é de autoria do vereador Alysson Alessandro de Barros (Podemos) e integrantes de outras famílias e historiadores pedem a revisão da lei ou sua revogação.
Imagem por Folha de Iperó e Texto por Folha de Iperó - 14/11/2025 às 11:30
- Atualizado 14/11/2025 às 11:30
Uma lei sancionada no último dia 22 de outubro pelo prefeito de Iperó Leonardo Folim (PSD), institui o “Dia do fundador de Iperó”, a ser comemorado anualmente no dia 19 de novembro, tem gerado repercussão e é alvo de questionamento por parte de historiadores e familiares de moradores mais antigos da cidade, que inclusive pedem a revisão da lei ou sua revogação. Isso porque, a lei, de autoria do vereador Alysson Alessandro de Barros (Podemos), destaca como fundador da cidade, Samuel Domingues, fato que é motivo de críticas e contestações, uma vez que enquanto familiares de outros moradores antigos ressaltam que esses deveriam ser incluídos na lei, que seria instituída como “Dia dos Colonizadores”, historiadores por sua vez são taxativos em defender que nenhuma dessas famílias, nesse período, de maneira isolada, teve qualquer iniciativa para “fundar Iperó”.
A lei, nº 1.238, destaca ainda, em seu parágrafo único, que neste dia o Poder Executivo poderá decretar, inclusive, ponto facultativo. Já em seu artigo 2º, e último, destaca que a data integrará o Calendário Oficial de Eventos do Município e poderá ser comemorada com atividades culturais, educacionais e esportivas que promovam a memória do “fundador de Iperó”, Sr. Samuel Domingues.
O autor da lei, em sua justificativa anexa ao então projeto, alega que “por meio da pesquisa histórica, ora acostada a este projeto de Lei e que fica sendo parte integrante, é possível verificar a importância do Sr. Samuel Domingues dos Santos como fundador da cidade de Iperó”. Justificou ainda no projeto de lei que “apesar da emancipação do Município de Iperó ter ocorrido apenas em 21 de março de 1965, muito tempo depois do falecimento do Sr. Samuel, nada do que hoje chamamos de Iperó teria acontecido sem a atuação de seu fundador”.
“O Sr. Samuel efetuou a compra de terras e, posteriormente, doação do imóvel para o estabelecimento da primeira escola no que viria a ser Iperó. A história do Município está entrelaçada com a história de vida do Sr. Samuel, pois em diversos momentos as atuações dele foram essenciais para o surgimento de Iperó. Graças a sua atuação, portanto, que a vila de Iperó surgiu e posteriormente, na década de 60, a mesma foi emancipada”, argumentou ainda em seu projeto que se tornou lei.
Há outros personagens
Argumentações do autor da lei que têm sido alvo de críticas por parte de historiadores e familiares de outros antigos moradores à época. Entre elas está o do ferroviário aposentado José Roberto Moraga Ramos. “Entendo que a história de Iperó começa quando a Estrada de Ferro Sorocabana adquiri terras para sua expansão, isso por volta do ano de 1926. O local começa a ter ‘cara’ de vila com a construção das casas para os funcionários da EFS. Até então Iperó (Santo Antônio) era ocupado por sitiantes como Rita Mota, esposa de Porphirio de Almeida, Paulo Antunes Moreira, Samuel Domingues, João Vaz, etc... Meu avô Mário de Melo nasceu aqui em 1904, era cunhado de Paulo Antunes Moreira (Paulo Bento)“, ressaltou e completou: “Respeito a opinião da família Domingues, porém, estaria sendo injusto com a história e a memória daqueles que não foram citados quando da criação do dia do fundador. Sugiro que ao invés de instituir o dia do fundador, seja instituído o Dia dos Colonizadores.”
Próprio site da Prefeitura contradiz a lei
Apesar de o prefeito Leonardo Folim ter sancionado a Lei que institui o “Dia do fundador de Iperó” e homenageia Samuel Domingues, o próprio site oficial da Prefeitura no link que trata da história da cidade não o chama de fundador e faz referência não apenas a Samuel Domingues, mas também a Rita Mota, esposa de Porphirio de Almeida, Paulo Antunes Moreira.
O jornalista e pesquisador Hugo Augusto Rodrigues, autor do livro “Cidade de Iperó – uma história repleta de histórias”, também critica o fato de lei instituir um “fundador” de Iperó. “A gente precisa ser justo, para que a população de maneira geral, e especialmente as novas gerações que estão nas escolas municipais atualmente, não aprendam sobre a história local com viés para um ou outro personagem apenas”, ressalta.
Destaca, com base em suas pesquisas e estudos que, muito antes do denominado “fundador de Iperó”, Samuel Domingues dos Santos, já havia acontecido muita história no território do atual perímetro urbano de Iperó. As ações dele, como as doações das áreas para a construção da igreja de Santo Antonio e do prédio da Escola “Dr. Gaspar Ricardo Júnior”, por exemplo, foram realizadas depois que a Sorocabana já havia construída toda a estrutura ferroviária e, de fato, já havia um povoado em formação.
”Se a gente precisasse determinar um fundador da cidade de Iperó que conhecemos hoje, foi na verdade uma fundadora, a Estrada de Ferro Sorocabana, que inclusive deu o nome de Santo Antonio inicialmente ao lugar, quando transferiu para cá a estação que ficava do outro lado do rio e, além disso, construiu todas as casas para os funcionários”, explica.
O historiador explica ainda que para a construção dessa estrutura toda, foram desapropriadas várias propriedades de sitiantes, conforme consta num Decreto Estadual de agosto de 1926, detalhando as áreas especialmente no percurso de Bacaetava até Iperó e depois seguindo em direção a Boituva e Tatuí. “O que confirma, novamente, que além da família Domingues dos Santos, já existiam muitas outras famílias na região do atual perímetro urbano. E é importante destacar que nenhuma dessas famílias, nesse período, de maneira isolada, teve qualquer iniciativa pra ‘fundar uma cidade’”, explica e finaliza: “Assim, pode-se concluir que a família Domingues dos Santos teve a sua importância, sim, nesse período de início da formação de Iperó, mas igualmente foram importantes as demais famílias que, ou já estavam aqui também ou vieram para cá após a instalação das estruturas da ferrovia e fincaram suas raízes com o sonho de uma vida melhor, também contribuindo para o desenvolvimento de Santo Antonio (hoje Iperó). E é importante destacar que nenhuma dessas famílias, nesse período, de maneira isolada, teve qualquer iniciativa pra "fundar uma cidade".
Sem manifestações
A reportagem da Folha de Iperó questionou tanto o vereador Alysson de Barros autor da lei como o prefeito Leonardo Folim, sobre a polêmica que envolve o caso, mas não houve qualquer tipo de retorno por parte de ambos para dar esclarecimentos à população sobre a lei que trata da história da cidade.